sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Foto: Jornal Cultura
São cinco agentes, um sentado, quatro em pé. Contemplativos, olhares incertos na direcção acinzentada da montanha.

Poucas horas faltam para encerrar o dia, o ano. Grande evento para quase todos, presença obrigatória para um chefe de família. Eles é que com as suas casas não podem nem sonhar, são polícias da unidade aeroportuária e estão (como sempre foi e será) em prevenção permanente. Relaxar não podem, pois há uma aviadora com voo nocturno agendado.

São 16h10. Passageiros começam a chegar para o check in, vem com isso a chatice do ordenamento do parque de estacionamento. São três minutos na zona gratuita, quase sempre violados e vertidos em multa, que sai sempre mais cara do que os 200 kwanzas cobrados por hora no parque. Pára um jeep preto.

O utente, cuja característica se encaixa no modelo executivo, caminha na direcção dos agentes. Tem cara de quem, muito bem colocado na esteira das influências, pretende antecipar, em tom de dar a conhecer, que vai exceder os três minutos e ninguém se meta com ele. Boa tarde, saúda ele, para o coro cortês dos agentes. Vocês é que estão de serviço hoje? A resposta é afirmativa. Olha, tenho algo no carro, venham ver. E dois polícias são surpreendidos com uma caixa de bolo-rei e outras guloseimas. É uma prenda nossa. O benfeitor, que não se identifica, sobe no carro e parte, não sem antes levar com o coro de gratidão dos agentes.

O observador, que sorri de satisfação ante o desinteressado gesto, diz baixinho... Assim, sim, ó senhor João, da pastelaria Áurea! Mais do que o lucro, o gesto! Mas não se fica por aí, pois as boas acções têm esse poder de nos transportar para gratas memórias e nos devolvem a esperança de não perder a esperança no que de mais profundo há no ser humano.

Até há pouco menos de 15 anos, ainda se via nas principais cidades do litoral de Benguela o saudável "assalto" à meia-noite com o “Mbeta-mbeta”, cantares a batucadas improvisadas, jornada que se prolongava até ao final do dia. O Natal, ainda mais o Ano Novo, faziam renascer o reencontro, a reafirmação da socialização e indirectamente a capacitação para a vida do ponto de vista antropológico, havendo a realçar a casa como ponto de partida da partilha.

"Twapandula ciwa/ weh/ etali ulima wapwa" (Estamos bem agradecidos/ eh/ hoje termina o ano) - trecho de gratidão no contexto de "se-se", um ritual popular Umbundu (com escalões de crianças, de homens e de mulheres), que consiste em andar de porta à porta cantando e dançando em celebração da passagem de ano. O anfitrião corresponde regalando bens alimentares, os quais serão consumidos em piquenique no dia seguinte.

Quando o coro é respondido com avareza, a sanção é por via do canto também: "Ove ku kwete cimwe/ weh/ nye watungila onjo?" (Se dizes nada ter, por que é que construíste a casa?) "Ha njala ko/ tucipangela onatale/ ha njala ko/ tucipangela ombowanu” (não é questão de fome/ cumprimos apenas a praxe de natal/ não é questão de fome/ cumprimos apenas a praxe de bom ano).

Boas entradas e que 2015 seja então um ano de hospitalidade.


Gociante Patissa, Aeroporto Internacional da Katombela, 31.12.2014

2 ondaka twatambula- comentários:

Sexto Sentido TV Zimbo com o escritor Gociante Patissa 2015

Vídeo | Lançamento do livro A Última Ouvinte by Gociante Patissa, 2010

Akombe vatunyula tunde 26-01-2009, twapandula calwa!

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